31 julho 2012

Fetiches?

            Por: Avelino Torcato Pereira "Choné"

Pode ser até polémico o que vou contar, mesmo passados tantos anos, mas faz parte das minhas memórias e não posso contar só as coisas boas que nos aconteceram em Moçambique.   Episódios destes só podiam acontecer exatamente porque estávamos a viver uma guerra e como é costume dizer-se: Na guerra vale tudo até tirar olhos! E foi quase o que aconteceu, pois andou lá perto!
Julgo ter sido no final de 1969 e estávamos acampados naquelas casernas velhas de chapa cinzenta na zona do aeroporto em Vila Cabral a fazer tempo para nos deslocarmos para qualquer outro sítio.
Foi então que a nossa Companhia teve de ceder 2 pelotões que conjuntamente com fuzileiros e comandos e ainda as milícias do Daniel Roxo se dirigiram para a zona de Cantina Dias, próxima do lago, a fim de participarem numa operação à Serra de Jessi.
Nesta saída eu não participei mas, segundo me contaram alguns militares dos nossos pelotões que estiveram presentes, a operação realizou-se durante a noite e foram-lhes dadas instruções no sentido de ficarem a fazer segurança na base da serra enquanto os fuzileiros e os outros militares com o Roxo atacavam a base IN em local mais acima.
Logo que começou o ataque e enquanto este durou a missão dos nossos era só de vigilância de modo a não deixar passar por ali qualquer fugitivo IN que tivesse escapado no ataque à base.
De repente começaram a ouvir o barulho de alguém a correr desesperadamente serra abaixo e, como saído do nada, aparece-lhes na frente um tipo que nem tempo teve para pensar.  Foi fogachada em cima do homem até mais não e ao aproximarem-se dele verificaram que estava cheio de buracos de tanta bala.
E, assim, desta forma os nossos militares participaram e cumpriram o que lhes tinha sido indicado para aquela operação.
Até que um dia no fim da comissão já no barco na viagem de regresso o Serrote abeirou-se de mim e mostrou-me um frasco com líquido contendo um dedo da mão de alguém perguntando-me: "Ó Choné sabes o que é isto?" Eu, apalermado com o que via respondi-lhe:  "É pá de quem é o dedo?"
E foi aí que ele me disse que era um dedo daquele "turra" que vinha a fugir serra abaixo e que alguns dos nossos (não interessa quem), além do Serrote, se serviram a seu bel-prazer, pois estava criada a ideia de que, quem conseguisse aquele género de troféus de guerra, tanto fazia dedos ou orelhas, era sinal de grande bravura! 

 Foto do Paulo Antunes: Os bravos da 2415 em turismo em Vila Cabral

3 comentários:

  1. Apesar da crueza deste tipo de episódios de guerra que poderá chocar, certamente, pessoas mais susceptiveis, de certeza absoluta que a grande maioria dos militares que foram atirados para a guerra ultramarina, infelizmente, os conhecem bem não só de os terem vivido pessoalmente como de ouvirem relatos dos mesmos.
    A guerra não deixa espaço para outra coisa que não seja a violência desmedida e irracional. E tb. não acredito em vinganças!
    Por isso mesmo o contrário também se aplica. Será preciso lembrar, por exemplo, o inicio da guerra em Angola e das atrocidades cometidas pela UPA deixando, por todo o lado por onde passavam, os corpos dos colonos portugueses esventrados e mutilados não poupando sequer indefesas crianças?

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  2. Olá a todos.Textos ou histórias iguais ás do Choné, quantas é que não existem? Não são propaganda de guerra mas sim factos que se passaram e que são derivados dela.Só quem não viveu situações de guerra é que não sabe avaliar estas situações. Custa. Mas é a realidade nua e crua dos factos resultantes de um cenário de guerra em que o combatente muda muitas vezes de personalidade perante situações que nos ultrapassam. O setres também conta muito.
    Amigo Soares. Envio mais três textos.Julgo ainda teres material para publicar. Pelo menos dei por falta! Agora vou apartir de amanhã, passar uns dias no Gerês regressando só no dia 12. Até lá, um grande abraço. Santa.

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  3. Olá camaradas! Acabei de chegar da minha viágem ao Gerês. Foram uns dias espectaculares por aquelas bandas com paisagens deslunbrantes.Para o ano espero que o estado do nosso pais ainda permita dias iguais a estes!
    Então? A málta ainda está toda de férias? Julgava á chegada ver mais algum texto no nosso blog, mas vejo que ainda está tudo de férias!
    Um abraço para todos. Santa.

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