Por: F. Santa
Mais uma vez, para a nossa juventude escolar.
Na guerra do Ultramar, as senhoras da Cruz Vermelha, foram bem visíveis não só para mim, bem como para todos os doentes internados nos hospitais Militares.
Quando
fui evacuado do H. Militar de V. Cabral (agora Lichinga) para o H. Militar
de Nampula, à chegada, lá estavam elas juntamente com os soldados
enfermeiros para nos dar apoio. Depois, quando fui novamente evacuado
para o H. Militar de Lourenço Marques, fui novamente recebido por elas
no aeroporto, tendo-me acompanhado até ao hospital. Quando cheguei,
(lembro-me perfeitamente) apareceu-me uma senhora da C. Vermelha já
com alguma idade, muito simpática, que me perguntou qual era o meu
estado e se tinha fome. Isto era quase meia noite. Retirou-se, e pouco
depois apareceu com uma tijela de sopa bem quentinha o que eu agradeci
pois a “larica” era muita! No avião (NORATLAS) não havia hospedeiras!
Depois
de ir para a enfermaria, (quartos com duas camas) passado algum tempo
lá apareceu ela com outra companheira, com uma bandeja. Era o
meu jantar. Que bem me soube!
Este
serviço não foi prestado a mim como furriel, foi prestado a todos
os outros que foram evacuados comigo, sem distinção e a todos os hospitalizados.
Quantoà senhora de idade, vim a saber umas horas mais tarde que era
a “AVOZINHA”. Era assim que ela era tratada por todos. Mas que avó!
Hoje, recordo-a com saudade pois para mim, ela foi como uma avó para
os cerca de quatro meses de internamento e também para todos os outros doentes.
Todos os dias havia visitas aos quartos com palavras de conforto para
todos, valiam mais que quantas esferográficas, isqueiros e até aerogramas.
Sentava-se na beira da cama e conversava longos minutos. No fim, o nosso
estímulo era outro. Aos fins de semana, na companhia de jovens de sexo
feminino que eram voluntárias, elas angariavam comida que restava das
grandes festas da alta roda que havia na cidade e que era depois distribuída
por nós. Aqueles que não podiam comer derivado aos seus ferimentos,
eram elas que lho davam na boca.
Depois,
quando fui evacuado para Lisboa, lá estava a avozinha com as outras
colegas a fazer-nos companhia até ao barco (fui evacuado de barco)
dando-nos coisas para comer no início da viagem. Claro que foi uma
despedida com lágrimas nos olhos, pois as lágrimas era a única coisa
que tinha-mos naquela altura para lhes oferecer como agradecimento em
troca do amor que nos deram e de todos os serviços prestados. Elas
foram avós e mães ao mesmo tempo. E sendo assim, este texto serve ao mesmo tempo de
um agradecimento e homenagem a todas elas pelo bem que nos fizeram.
Bem hajam!
Tudo
isto faz parte da história da nossa guerra. Podem ser coisas simples,
para alguns até sem importância, mas para quem as viveu tem muito
significado. Os jovens de hoje, não pensem que nos hospitais tudo eram
rosas. Para muitos, estarem feridos e longe da família eram apossados
da solidão, solidão que nos roía por dentro às vezes mais que os ferimentos. Se leram o texto anterior sabem do que falo.
Esperando
por vocês na parada do “SANCHO” no dia 5 de Maio, até lá um grande
abraço do SANTA.
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