Por: F. Santa

Aqui julgo que a guerra já tinha ficado para trás. Deve ser já no sul, muito próximo do regresso.
VAGUEANDO PELA GUERRA
Hoje vou falar superficialmente um pouco sobre os que morriam na guerra, das condições de vida no mato e outros.
Sabiam que os familiares é que tinham de pagar a trasladação dos corpos para o Continente? Pois é a verdade. As famílias eram informadas da morte dos seus familiares e tinham um prazo (de que agora não me lembro) para depositar uma certa quantia que rondava (salvo erro) os 7.000$00 a 12.000$00 (na altura), conforme a província ultramarina em que morriam e o local do Continente onde iriam ser sepultados. Sendo assim, chega-se à conclusão de que o Estado Português só pagava a ida para a guerra, e o regresso daqueles que ficavam vivos! Os mortos tinham que pagar o seu regresso! Quem tinha dinheiro trazia-os para cá, os outros ficavam lá, estando hoje parte das suas sepulturas ao abandono.
Nós estávamos ao serviço de quem? Do Estado. Quem era o responsável por todos nós combatentes e seus familiares? O Estado. Morríamos. Quem era o responsável? Os familiares. Era assim. Hoje as coisas mudaram… São outros tempos! Pena é que este novo Estado Português não se digne transladar os restos mortais dos nossos camaradas que ainda se encontram espalhados por aqueles “cemitérios” completamente ao abandono. Era a última homenagem que podiam dar àqueles que à Pátria tudo deram (até a vida). Trazê-los? É um dever. É uma obrigação.
As difíceis condições de vida que passávamos, chegavam a provocar grande desgaste físico. Tanto em Angola como em Moçambique, e ainda com maior incidência na Guiné, devido ao terreno, já para não falar dos nossos camaradas que participaram no início da guerra.
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Destacamento de Matipa |
A preparação de muitos não era nenhuma para o tipo de guerra que encontramos (principalmente os primeiros). O armamento, também não era o ideal, nem para atacar nem para defender (eu andei com uma bazuca às costas, avariada, só para meter medo ao inimigo!). A detecção de minas, muitas vezes (se não sempre) era feita praticamente por meios artesanais inventados por nós (as picas), as transmissões, eram rascas -- um suplício. Os rádios de que dispúnhammos (de uma maneira geral) raramente funcionavam. Na sede da Companhia não havia tanto esse problema, mas no mato é que era o bom e o bonito! E no tempo das chuvas? As dificuldades aumentavam.
Então em Matipa é que era impossível contactar com alguém. Era o isolamento total do resto. Chegávamos a ir para pontos mais altos e nada! Esta foto (parecida com outra já publicada) onde eu estou, foi tirada perto de Massangulo durante uma patrulha, a tentar ligação com Lione.

Quando vou às escolas, os alunos perguntam como eram as nossas casas de banho, como tomávamos banho, onde é que nós comíamos e se era bom. Bem. Em alguns casos as nossas casas de banho era ir ao meio do mato... Quanto à comida nem era boa nem era má, era péssima. Tomar banho? Muitas vezes era um bidon (que serviu ao Gasóleo ou à Gasolina) montado em cavaletes, água lá para dentro e já está! Uma vez um aluno fez-me esta pergunta: se tínhamos água canalizada! Dá para entender.
Pois é. A nossa juventude sabe muito pouco da nossa guerra do ultramar, é bom que todos nós possamos divulgar para eles o que realmente se passou e em que condições. Falando em métodos artesanais de encontrar minas, não podia passar sem apresentar esta foto que foi tirada pelo nosso camarada do B. Caç.3834 Carlos Vardasca (um abraço). Como se pode ver é bastante original. Segundo diz o nosso camarada, os resultados não foram lá muito bons...
Para todos um grande abraço do SANTA
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