25 junho 2009


O FILME DO MEU ACIDENTE


Em todos os convívios se fazem relatos de coisas que aconteceram entre nós no ultramar mas, todos me perguntam o que é que me aconteceu. Ora se bem me lembro foi assim: Estava-mos em Chala e já fazia muito tempo que não recebia-mos correio. Como se sabe a malta nestas circunstâncias entrava em paranóia! O correio estava retido em Vila Cabral ou Lione, já não me lembro bem e era preciso ir buscá-lo. Arranjei voluntários e lá fui a caminho todos montados num (Unimog)! A certa altura, lembro-me que passámos por cima de um grande buraco que estava camuflado com folhas tendo saltado a grande altura para fora da picada rolando pelo chão. Momentaneamente perdi os sentidos que recuperei pouco depois mas, só me lembro de acordar na cama já no Lione. Fui depois evacuado para o Hospital de V. Cabral, onde fui observado e dias depois regressei a Lione onde estive alguns meses com aparelho de gesso na perna. Tendo regressado novamente ao hospital aparecera problemas na coluna e cabeça resultantes do dito trambolhão. Daqui resultou mais tarde a minha evacuação para o H. de Nampula onde estive internado cerca de três meses e meio, tendo sido detectada uma fractura na cabeça por solidificar e problemas na coluna a nível de vértebras. Depois daqui fui evacuado para o H. de Lourenço Marques onde estive quase sete meses em recuperação para ganhar músculo na perna e movimento no pé. Depois disto fui novamente evacuado para Lisboa indo direitinho a Campolide para os anexos do H. Militar (mais conhecidos pelos "galinheiros") onde estive cerca de um ano fim do qual fui dado incapaz para o serviço militar. Fui para casa. Entretanto casei, durante nove meses não me deixaram trabalhar dando-me uma pensão de novecentos escudos. A partir do dia em que vos deixei sei que a vossa tarefa foi mais perigosa e complicada mas também não foi fácil para mim apanhar um ano e dez meses de hospital.
Foi mais um filme de guerra, este passou-se comigo, mas outros filmes houve de camaradas nossos vitimados pelas minas, pelas emboscadas, ataques a aquartelamentos e outros maltratados em hospitais escondidos da sociedade, abandonados como farrapos por quem deles se serviu. A nós combatentes e deficientes do ultramar jamais nos calarão. Temos todos no corpo as marcas da guerra e queremos que a nossa Pátria não se esqueça de nós dando-nos para o resto das nossas vidas aquilo a que temos direito.

Um abraço do camarada Santa


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